segunda-feira, 28 de maio de 2012

O Grande Porco




Podia, mas não. Não o ouvi da minha avó. Ouvi outras frases, mas não esta. Não que a Senhora não tenha sapiência para tal erudição, simplesmente é uma verdade incómoda. Desde sempre. Ainda o macaco estava a deixar de o ser e o primeiro homem começava a juntar javalis em cercas e já se sabia:


- “A melhor espiga é para o pior porco.”


É imperativo engordar o porco, a qualquer custo. Um mau suíno é aquele que não cumpre o seu desígnio. Encher o bandulho à larga, constituindo bem as carnes, para depois ser comido. Ponto final. Nasce bacorinho, fofinho, rosinha e meio parvo, finda chouriço, feijoada, costeleta ou aquilo que a patroa quiser fazer antes da novela. 

Se o bicho não cresce direito, só há uma solução: abrir os cordões à bolsa e deixar o farelo de lado. Sai caro. E já não é de agora. Grunhos com manias de senhor já por aí andam há imenso tempo. E quanto mais se adia a matança, mais o pessoal se afeiçoa ao bicho, mesmo com caprichos. E vai-se envolvendo na lama, entretido. E vai comendo.


Quando o porco deixa de ser leitãozinho e passa a ser um macróbio incontinente com cheiro a ranço velho é que o caseiro se lembra que não o matou. Normalmente, já vai tarde. Exemplo? Na Madeira só agora se aperceberam daquilo que já há muito se sabia. Nova auditoria do Tribunal de Contas, mais facturas de muitos milhões em atraso.


 Agora é que querem apresentar moções de censura? Agora é que querem a matança? Agora vão tarde. Que o afastem. Que o esqueçam. Mas que partilhem a culpa do estado em que estão. Mais culpado que o porco que fez o que sabia é quem o deixou chafurdar uma vida.



Imagem retirada de http://www.opresenterural.com.br/caderno.php?c=5&m=29. Acedido em 28/05/2012.                                         

segunda-feira, 21 de maio de 2012

A Galinha Sem Cabeça.


Era uma vez. Dessa vez a sogra ia lá jantar a casa e, como de outras vezes, o que ela queria mesmo era comer galinha, o pescoço da bichinha, que, pelas partes rijas e compleição crocante, o tornam particularmente apetecível.

Era outra vez. Dessa outra vez, um ministro, especialista na lide com os jornalistas, essa corja oportunista, ameaça com um blackout e a publicação de informações sobre a vida privada de uma profissional - conseguidas onde e com que justificação? - que investigava o seu relacionamento com o ex-chefe do Serviço de Informações Estratégicas e de Defesa, um tipo porreiro.

No que toca à vez considerada em primeiro, para manter o cachaço alto e garantir a aprovação da velha, Lloyde Olsen decidiu acertar com o machado mesmo junto à cabeça do animal. O que aconteceu? Estrebuchou e esperneou. Sobreviveu porque, por tão rente golpe, ficou o tronco cerebral intacto, garantindo um coágulo a não ocorrência de uma hemorragia fatal. Nascia Mike, a galinha que não se apercebia da falta de cabeça.

Relativamente à outra vez, também o ministro esperneia e estrebucha, tentando, através do envio para a ERC de questões irrelevantes – “jornalismo interpretativo” – afastar a comunicação social e o público da verdadeira questão. O importante para este caso deixou de ser o conteúdo da peça, que nem chegou a ser publicada pelo periódico. Se recebia ou não informações, se as requeria ou não, se se serviu das sugestões do ex-espião para os quadros das secretas... Irrelevante. Houve limitação do trabalho da imprensa. Houve pressão do poder político sobre o trabalho jornalístico. E isso é inaceitável.

O que liga estas duas vezes? Mike, após 18 meses de vida, muitos dos quais de feira em feira, morreu asfixiada no seu próprio muco, num quarto de hotel, porque Lloyde se esquecera do conta-gotas com que a alimentava e removia os sucos do gasganete. Relvas, após 10 meses como ministro, muitos dos quais de feira em feira, nunca mais morre, politicamente, com o muco que lhe escorre da garganta. Pode ser que seja desta.








Imagem retirada de http://www.laboiteverte.fr. Acedido em 21/05/2012.

segunda-feira, 14 de maio de 2012

Finalmente, a grande revolução.


Já se esperava, era inevitável. E previsível. O povo - o povinho do Soares? - cansou-se, agastado por tudo e reclamando quase nada. E saiu à rua. Aos milhares, no fim-de-semana, apanhando o poder repressor de surpresa, organizaram-se para ocupar os pontos estratégicos do país, invadindo, inteligentemente, os últimos redutos de esperança para combater a crise. E lutaram com bravura. Munidos de cruzes, terços, marmitas e mesas portáteis – daquelas azuis, com banquinhos embutidos, que se dobram sobre si para caberem na mala. Armados de cachecóis, bandeiras e very lights azuis. Fortalecidos por Calippos de morango, imperiais e pratos de caracóis. Fizeram história.

De uma vezada só, durante cerca de 3 dias, Portugal viu o que não acontecia há quase 40 anos, uma revolução. Fátima, a praia e, com particular violência, a Avenida dos Aliados, no Porto. Ninguém pôde ficar indiferente. Ninguém pôde fingir que nada se passava. Ao mesmo tempo que os manifestantes, sem o dizerem, gritavam por dinheiro, por emprego, por comida, enfim, por dignidade, descobriram, acidentalmente, a única saída para situação em que vivem: rezar, rezar muito e com afinco, ir muitas vezes à praia para encontrar um bom partido e, no tempo livre, ver a bola com o resto da malta, para apaziguar a alma.










Imagem retirada de http://pedroturner.blogspot.pt/2011/04/25-abril-1974.html. Acedido em 14/05/2012

segunda-feira, 7 de maio de 2012

Já ninguém gosta de bitoque


(1)
Que o Português é um bicho ingrato, já se sabia, mas o recente rancor face ao bitoque é que ninguém percebe. Tornou-se odioso ir ao cafezinho do Velho Diamantino pedir um pratinho robusto do clássico português que já constituía, a meio-do-dia, o povo trabalhador antes do Outro pôr a canalha de calção castanho e braço estendido a adorar a Pátria.

Uma cola, que o patrão já não deixa pedir uma minizinha para aquecer o espírito e reconfortar a alma, enquanto se espera pelo derradeiro – a malga. Montada na cozinha “imaculada” da D. Gertrudes, que já não aguenta o miúdo de colete reflector, a ASAE-ou-lá-o-que-é, a vasculhar-lhe as facas e a mandar fazer obras.

O arrozinho branco, “sequinho”, a namorar com a batata enquanto o ovo, a jeito para molhar a broa, se pavoneia em cima do bife. Tudo isto por uns euritos. Sete certinhos, que o Velho Diamantino não se atreveu a aumentar o preço da diária, apesar do aumento do IVA para 23%, para a clientela não fugir. A pouca que ainda lá vai. Agora, só os de sempre, os que já lá iam, nem que fosse apenas para dizer boa tarde.

Anda meio mundo distraído com as últimas. É normal. Mas é que enquanto o Pingo Doce mata a  Mercearia do Gomes e o Seguro cola o poster do Hollande na porta do quarto, qual adolescente apaixonada, o Velho Diamantino vai ter de entregar, já no dia 15 de Maio, um quinto de toda a receita que conseguiu este ano. E vai despedir a Anita, que até se queria casar em Junho.

- Paciência Anita, a culpa não é tua, é dos tipos em Lisboa. Sabes, já não é chique gostar de bitoque.