Entre as luzes que se estalam na cara e o cegam durante demasiado tempo, ele
viu-a. Mesmo de olhos fechados. Mesmo a lacrimejar compulsivamente.
Desmesuradamente. Porque a mesma mortalha, ponta de cigarro, que mutila em
brasa a carne incauta, seguindo-se o tal: “Desculpa, estás bem? Ah? Não ouvi.
ESTÁS BEM? Sim, sim…claro.”, escarra um fumo odioso que empala os olhos bem até
ao nervo. Por sorte, o mesmo povo que defeca alto fumaça, disfarça-a com o
melhor perfume. Tocante a preocupação. Tocante o cheiro.
Aventurou-se até ela. Entre cotovelos, fios de cerveja que teimam
fazer-se escorrer até ao mais íntimo de si, gelando o que não era suposto, e
abanões, e matulões-que-não-dão-um-passo-porque-isso-é-uma-afronta-à-sua-virilidade.
Não era digna de tamanha provação. Não era tão interessante como na Foto de
Perfil. Talvez nem valesse a pena. Talvez noutra perspectiva. Talvez fosse da
luz. Talvez porque a maquilhagem desistira após horas agarrada a marcas de
unhadas e concentrados de pús. Talvez, principalmente, porque o decote ao vivo
era menor.
Balbuciaram nada. Gritaram à surdez imposta pelas colunas de som. Até ela
ir embora. Até ele ouvir: “Encontra-me no Face”. Encontrou. Agora são amigos.
Oficialmente. Ele os restantes quatrocentos que viram o mesmo decote. Durante
meses, religiosamente, gostou de cada música, comentou cada foto com agilidade
e arte camonianas, “Devias ser modelo. Linda!”, desejou que ela reparasse nos
“Gostos” estratégicos nas páginas da Katy Perry, numa qualquer loja de cupcakes
cor-de-rosa e no Alfaiate Lisboeta.
Meses agarrado ao computador. Para nada. Nem se dignou a um aceno. Uma
agnição da sua existência. Não o reconheceu, quando passou. Para ela, ele é
apenas o tipo com a foto do Carrera amarelo. Não se conhecem. Não se falam. Mas
ele sabe que ela vai ao concerto em Novembro. E sabe com quem. Enquanto ela passa distraída, ele vai sabendo de tudo.
Imagem retirada de http://www.johnhaydon.com/2009/04/facebook-groups-pages-tips/. Acedido em 22/11/2012.
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